Cristiane Aparecida R. Garcia
François-Marie-Gabriel Delanne, nasceu em 23 de março de 1857, em Paris.
Seus pais Alexandre Delanne e Marie Alexandrine Didelot, tomaram contato com o Espiritismo após ouvirem falar sobre as duas primeiras Obras de Allan Kardec – O Livro dos Espíritos e O livro dos Médiuns – momento em que seu pai resolveu conhecer Allan Kardec, que o convidou para assistir a um das reuniões na Sociedade que havia sido recentemente fundada por este.
Impressionados com o conteúdo dos referidos livros, os pais de Delanne resolveram dedicar-se ao estudo dos mesmos e fundar, no final do ano de 1889, um grupo espírita em sua própria residência, sendo que rapidamente, sua mãe Marie Alexandrine tornou-se uma excelente médium mecânica.
A família Delanne dedicou-se arduamente pela divulgação do Espiritismo, tendo formado vários adeptos da doutrina, não somente na localidade em que moravam mas em vários outros locais, por onde o Senhor Alexandre Delanne passava em viagens e, posteriormente, o próprio Gabriel Delanne.
Assim, o nosso biografado cresceu no ambiente espírita, tendo partilhado do convívio direto com Allan Kardec que frequentava sua casa, espelhando-se assim no mestre para acolher em seu íntimo, plenamente, a doutrina espírita.
Gabriel Delanne, passou pelos Colégios de Cluny (Saône-et-Loire) e de Gray (Haute-Saône), e em 3 de novembro de 1876, ingressou na Escola Central das Artes e Manufaturas, vindo a desistir deste curso em 26 de janeiro de 1877. Diz-se que a sua desistência dos estudos decorreu das parcas condições financeiras da família, que sempre possuíram modestos recursos.
Gabriel Delanne foi admitido como engenheiro na Companhia de Ar Comprimido e Eletricidade Popp, ofício este que exerceu até 1892.
Paralelamente as suas atividades profissionais, Gabriel Delanne militava no movimento Espírita, assistindo em sua própria casa várias sessões espíritas.
No início das suas aparições junto ao movimento espírita, podemos retratar o discurso proferido por Gabriel Delanne no Cemitério Père Lachaise, em 31 de março de 1880, na cerimônia anual comemorativa do desencarne de Allan Kardec, com os seguintes dizeres[1]:
“Allan Kardec, não veio trazer uma religião, não impôs nenhum culto. Sua moral é a de Jesus, destituída de qualquer falsa interpretação, mas o que ele doou à humanidade foi uma doutrina capaz de responder a todas as objeções da incredulidade e a todos os grandes problemas da razão.
Com efeito, até aqui, só temos analisado o lado moral de sua doutrina, porém, seu estudo mais aprofundado nos mostra que, seguindo seus ensinamentos, pode-se chegar às mais belas descobertas científicas.
Se há um campo de estudos ainda inexplorado é o que compreende as relações entre o mundo invisível e o nosso.
Quantos problemas a resolver, antes de poder dar uma teoria científica dessas relações, mas um dia virá em que elas serão conhecidas como fenômenos estudados cientificamente e não serão mais segredos para nós.”
Com efeito, Gabriel Delanne dedicou-se arduamente à vertente científica da doutrina Espírita, e até o final de sua existência terrena, expandiu e semeou a boa nova.
Gabriel Dellane, além de pesquisador e escritor no âmbito cientifico, colaborou na fundação da Federação Espírita Francesa e Belga, que em 1883, foi denominada Federação Francesa-Belgo-Latina, instituição esta que passou a veicular, bimestralmente, uma revista intitulada “Le Espiritisme”, periódico em que figurou como redator geral.
O referido periódico pode ser criado graças à ajuda da Sra d’ Esperance, senhora inglesa que anos mais tarde tornou-se uma admirável médium.
A família Delanne fundou a União Espírita Francesa, em 1882, com sede na cidade de Paris, sendo que os seus membros se reuniam semanalmente com vistas a discutir as questões espíritas e reunir todas as forças espíritas que se espalhavam pelo País.
Gabriel Dellane defendia, inclusive, que a colaboração dos irmãos espíritas fosse gratuita, pois entendia que os ensinamentos de Jesus deveriam ser aplicados integralmente.
Novamente, Gabriel Delanne discursou na cerimônia de sepultamente da esposa de Allan Kardec, em 23 de janeiro de 1883, após, decorridos 14 anos do desencarne do seu marido honrando-a com as seguintes palavras, cujo excerto segue abaixo[2]:
“A Sra. Allan Kardec foi, verdadeiramente, a mulher forte, segundo o Evangelho. Tornando-se a esposa do grande vulgarizador do Espiritismo, adotou suas ideias. Empregou todas as suas energias no estudo dos novos princípios; venceu os preconceitos de seu século e de sua educação e se elevou, por sua vontade, até á altura do Espírito do nosso Mestre.”
Gabriel Delanne foi um dos maiores propagadores da sobrevivência e comunicabilidade dos Espíritos, tendo escrito várias obras de cunho científico, centrando as suas investigações no corpo perispiritual, por entender que este era o substrato fundamental a todos os fenômenos mediúnicos e anímicos.
A partir de 1899, Gabriel Delanne se dedicou a vice-presidência e posteriormente a presidência da Sociedade Francesa de Estudos dos Fenômenos Psíquicos, evidenciando a partir dessa investidura, o verdadeiro apostolado na divulgação dos ensinamentos espíritas.
Ressalta-se que as suas obras escritas iniciaram-se a partir de 1885, conforme relação bibliográfica abaixo. Colacionamos uma breve sinopse sobre as obras publicadas em Língua Portuguesa:
- Le Spiritisme devant la Science (O Espiritismo perante a Ciência). Paris: Ed. J. Meyer (B.P.S.), 1885.
Sinopse: O autor, nome profundamente respeitado no meio espírita, demonstra neste livro que o Espiritismo, longe de contrariar a Ciência, é nela que se firma, não havendo incompatibilidade entre um e outro. Relaciona casos comprovados experimentalmente de aparições materializadas, telepatia, transportes, visão a distância e premonição, entre outros, relatando a adoção, por grande número de cientistas, da teoria espírita como a única explicação geral de todos os fenômenos investigados. Aconselha a pesquisa séria da mediunidade e reprova energicamente os que, por preconceito ou fanatismo, não admitem a adoção de medidas preventivas de mistificações no campo experimental. Acrescenta um Apêndice que visa informar sobre a consagração pela Ciência de algumas das mais importantes teorias da obra, várias décadas depois de sua publicação.
- Le Phénomène Spirite (O Fenômeno Espírita). Paris: Ed. J. Meyer (B.P.S.), 1893;
Sinopse: Acurado raciocínio, exposição fácil e temas do maior interesse são reflexos da personalidade do autor, que produziu este livro de inestimável interesse. Expõe, com naturalidade, fenômenos insólitos em capítulos como: a família Fox, fotografia espírita, Espiritismo na antiguidade, fenômeno de transporte e outros. Contradiz argumentos de negativistas da época os mesmos da atualidade e proclama a grande realidade do Espírito imortal.
- L’Évolution Animique (A Evolução Anímica). Paris: Ed. J. Meyer (B.P.S.), 1895;
Sinopse: Este livro mostra que através uma evolução ininterrupta, a partir das formas mais rudimentares, até à condição humana, que o princípio pensante conquista, lentamente, a sua individualidade, elevando-se, por uma série de reencarnações, para destinos mais sublimes. Os estudiosos da Doutrina Espírita encontrarão aqui rico material sobre o importantíssimo elemento de ligação entre o corpo e o Espírito: o perispírito, cuja realidade Delanne busca comprovar. Esta obra ressalta que o Espiritismo faculta a chave daquilo que a ciência humana é impotente para explicar.
- L’Âme est Immortelle (A Alma é Imortal). Paris: Ed. J. Meyer (B.P.S.), 1897;
Sinopse: A imortalidade da alma é demonstrada experimentalmente nesta obra. Por meio da observação e sem ideias preconcebidas, o autor reúne provas autênticas, absolutas e irrecusáveis da existência da alma unida ao perispírito. Delanne explica cientificamente de que maneira a alma conserva a sua individualidade após a morte do corpo físico. E ainda afirma que “estes primeiros esboços de uma fisiologia psicológica transcendental são o prenúncio de que (…) o Espiritismo aparecerá qual realmente é: a ciência do futuro”.
- Recherches sur la Médiumnité. Paris: Ed. J. Meyer (B.P.S.), 1898;
Sinopse: O grande projeto de despertamento da consciência planetária começou a tomar forma em meados do século dezenove, com a eclosão de notáveis fenômenos mediúnicos que se alastraram por toda parte, e de onde viria a brotar o Espiritismo. Esta obra do sábio francês Gabriel Delanne é um precioso documentário dessa fenomenologia que foi registrada na época por pesquisadores idôneos, constituindo o que se pode chamar de provas irrefutáveis da comunicação com o mundo dos Espíritos. Entre dezenas de casos apresentados por Delanne em Pesquisas sobre Mediunidade, salientam-se as biografias de Joana d’Arc e de Luis XI, ditadas a uma jovem de apenas quatorze anos e sancionadas por Kardec, a conclusão de um romance do escritor Charles Dickens por um médium de quinze, a revelação dos dois satélites de Marte, dezoito anos antes de sua descoberta, bem como soluções de problemas científicos e apresentação de remédios eficazes. Há casos curiosos e raros, como a psicografia de bebês e de médiuns analfabetos, mensagens em línguas estrangeiras e por código Morse (do Espírito de um telegrafista para outro encarnado) e de um ex-surdo-mudo por linguagem de sinais; tudo de absoluto desconhecimento dos médiuns. Mas o criterioso espírito científico de Delanne vai mais além e faz questão de analisar e conceituar separadamente a mediunidade mecânica e outros fenômenos anímicos, como a telepatia, a clarividência, o sonambulismo e a autossugestão. Assim, neutralizando críticas, faz ressaltar de forma lúcida a autenticidade da verdadeira intervenção dos Espíritos, compondo um precioso documento para compreender as origens do Espiritismo. Esta obra de quase 600 páginas, inédita no Brasil, é o que se pode dispor de mais valioso para o aprofundamento do entendimento dos conceitos da mediunidade.
- Comptu Rendu du Congrès Spirite et Spiritualiste Internacional 1900. Paris: Societé Française d’Étude des Phénomènes Psychiques, 1902; (não existe edição em língua portuguesa)
- Les Apparitions Matérialisés des Vivants et des Mort, tome I. Paris: Librairie Spirite, 1909; (não existe edição em língua portuguesa)
- Les Apparitions Matérialisés des Vivants et des Mort, tome II. Paris: Librairie Spirite, 1911; (não existe edição em língua portuguesa)
- Documents pour servir à l´étude de la Réincarnation (A Reencarnação). Paris: Éditions de la B.P.S, 1927.
Sinopse:: A doutrina da reencarnação é a única que corresponde à ideia que formamos da Justiça Divina, a única que explica o porquê das desigualdades sociais, intelectuais e morais entre os homens, bem assim os sofrimentos e mazelas humanas. Com o rigor de sua lógica e a inteligência de sua argumentação, o autor consegue dar à tese da reencarnação uma base indestrutível. Após uma “revista histórica sobre a teoria das vidas sucessivas”, Delanne realiza valioso estudo sobre: a passagem do princípio inteligente pelo reino animal; as experiências de renovação da memória; a hereditariedade e as crianças-prodígio; as recordações de vidas anteriores; os casos de reencarnação anunciados antecipadamente; o conjunto de argumentos favoráveis à reencarnação. O autor demonstra que a reencarnação é sublime lei da Criação, operando a reeducação e a evolução das almas, na longa jornada da imortalidade.
Gabriel Delanne em sua vida física, não gozou de boa saúde, tendo na infância diversos problemas de visão, vindo a comprometer-lhe tal sentido de forma quase irreversível. Por volta de 1906, foi acometido por uma paralisia dos membros inferiores que lhe obrigaram a andar de bengalas e depois de cadeira de rodas.
Mesmo com tantas limitações, Gabriel Delanne não se furtou a contínua divulgação do Espiritismo, participando de diversas conferências, na França e no Exterior.
No período da 1ª Grande Guerra, o estado de saúde de Gabriel Delanne tornou-se ainda mais delicado, pois a visão ficou praticamente comprometida, bem como as severas dificuldades de locomoção.
Seu desencarne ocorreu em 15 de fevereiro, de 1926, aos 69 anos de idade, tendo sido sepultado no famoso cemitério parisiense de Père Lachaise.
Gabriel Delanne, da erraticidade, nos concedeu mais ensinamentos, através da entrevista dada ao Espírito de Andre Luiz, em 20 de agosto de 1965, na cidade de Paris, chegando até nós através da mediunidade de Chico Xavier[3], e, nesta condição, nos brindou com um raciocínio criterioso e absolutamente lúcido, conforme podemos depreender dos seguintes trechos extraídos da referida obra:
André Luiz – Admite que os princípios espíritas estejam caminhando lentamente no mundo?
Gabriel Delanne – Não penso assim… As atividades espíritas contam pouco mais de um século e um século é período demasiado curto em assuntos do espírito.
André Luiz – Muitos amigos na Terra são do parecer que os Mensageiros da Espiritualidade Superior deveriam patrocinar mais amplas manifestações de mediunidade de efeitos físicos para benefício dos homens, como sejam materializações e vozes diretas. Que pensa a respeito?
Gabriel Delanne – Creio que a mediunidade de efeitos físicos serve à convicção, mas não adianta ao serviço indispensável na renovação espiritual. Os Espíritos Superiores agem acertadamente em lhe podando os surtos e as motivações, para que os homens, nossos irmãos, despertem à luz da Doutrina Espírita, entregando a consciência ao esforço de aprimoramento moral.
André Luiz- Conquanto tenha essa opinião, julga que o Espiritismo precisa atender ao incremento e melhoria da mediunidade?
Gabriel Delanne – Não teríamos o Evangelho sem Jesus Cristo e não teríamos Jesus Cristo sem o socorro aos sofredores pelos processos mediúnicos que lhe caracterizaram a presença na Terra.
André Luiz – Para qual região devemos nós, a seu ver, conduzir a pesquisa científica na Terra, de vez que a conquista da paisagem material de outros planetas não adiantará muito ao progresso moral das criaturas?
Gabriel Delanne – Devemos estimular os estudos em torno da matéria e da reencarnação, analisar o reino maravilhoso da mente e situar no exercício da mediunidade as obras da fraternidade, da orientação, do consolo e do alívio às múltiplas enfermidades das criaturas terrestres…
André Luiz – Onde os percalços maiores para a expansão da Doutrina Espírita?
Gabriel Delanne – Em nossa opinião, os maiores embaraços para o Espiritismo procedem da atuação daqueles que reencarnam, prometendo servi-lo, seja através da mediunidade direta ou da mediunidade indireta, no campo da inspiração e da inteligência, e se transviam nas seduções da esfera física, convertendo-se em médiuns autênticos das regiões inferiores, de vez que não negam as verdades do Espiritismo, mas estão prontos a ridicularizá-las, através de escritos sarcásticos ou da arte histriônica, junto dos quais encontramos as demonstrações fenomênicas improdutivas, as histórias fantásticas, o anedotário deprimente e os filmes de terror.
André Luiz – Como vê semelhantes deformações?
Gabriel Delanne – Os milhões de Espíritos inferiores que cercam a Humanidade possuem seus médiuns. Impossível negar isso.
Assim, temos que evidenciar que Gabriel Delanne, sem sombra de dúvida, pode ser considerado como um dos três apóstolos do Espiritismo, ao lado de Léon Denis e do próprio Codificador.
BIBLIOGRAFIA:
- BODIER, Paul e REGNAULT, Henri. Gabriel Delanne Sua vida, seu apostolado e sua obra, Edições CELD, Rio de Janeiro, 2001
- XAVIER, Francisco Cândido e VIEIRA, Waldo. Entre irmãos de outras terras. Editora FEB
- CARNEIRO, Victor Ribas. A B C do Espiritismo. Editora Federação Espírita do Paraná, 1996
- Site: WWW.autoresespiritasclássicos.com
[1] Bodier, Paul e Regnault, Henri. Gabriel Delanne Sua vida, seu apostolado e sua obra, Edições CELD, Rio de Janeiro, 2001
[2] Op, cit, pág. 33
[3] Xavier, Francisco Cândido e Vieira, Waldo. Entre irmãos de outras terras. Editora FEB