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A Ponte para o Suicídio

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Sonia Theodoro da Silva

http://filosofandocotidiano.blogspot.com

No livro “O Espírito da Verdade” de autores diversos psicografados através da mediunidade lúcida e coerente de Chico Xavier, encontramos a mensagem de Hilário Silva, “Há um século”. Nela, seu autor relata um episódio da vida de Allan Kardec, ocorrida em abril de 1860.

Numa manhã daquela data, o codificador quedara exausto e desalentado diante de tantas pressões, críticas, perseguições, calúnias. Sua esposa lhe traz uma encomenda que acabara de chegar, o professor abre, e encontra uma carta assinada por Joseph Perrier, relatando-lhe a própria história. Havia sido um sério candidato ao suicídio, premido pelas dores e aflições oriundos de dramas pessoais que não soubera enfrentar. Numa noite, encaminhara-se às margens do rio Sena, e decidido a jogar-se da Ponte Marie, ao apoiar-se com a mão direita na amurada tocou num objeto que caiu ao solo. Surpreendido, tomou o volume nas mãos, e procurando a luz mortiça de um poste, pode ler: “Esta obra salvou-me a vida. Leia-a com atenção e tenha bom proveito. – A. Laurent”. Estupefato, leu a obra – O Livro dos Espíritos -, ao qual acrescentou breve comentário, encaminhando-o ao professor Rivail.

Kardec abriu o pacote e encontrou o livro ricamente encadernado, em cuja capa viu as iniciais de seu pseudônimo. Abrindo-o, encontrou a mensagem acima, acrescida das seguintes palavras: “Salvou-me também. Deus abençoe as almas que cooperaram em sua publicação.” Após a leitura, o prof. Rivail, refeito dos dramas que vivia por preservar a Doutrina dos Espíritos das tentativas que visavam deturpar os seus princípios, pensou: “era preciso continuar, desculpar as injúrias, abraçar o sacrifício e desconhecer as pedradas…”(Emmanuel, Xavier, 1999, p.127).

Dois aspectos se destacam nesse episódio: o primeiro, os apodos que o Espiritismo e todos aqueles que se lhe conservam fiéis recebem, por lhe preservarem os princípios indenes de interpretações e interpolações pessoais, ou dogmáticas, ou academicistas. O Espiritismo conservar-se-á livre, pois livre é a sua natureza, livre é a sua fonte onde se banham todos aqueles que buscam libertar-se das amarras e sistemas que o ser humano criou para si nos diversos momentos de seu crescimento.

O Espírito André Luiz, num contundente artigo, “Defesa da Verdade” (livro Sol nas Almas), enfatiza: “ninguém precisa ferir ou impor nesse ou naquele ponto de sustentação doutrinária, mas o espírita tem a obrigação de estudar e refletir, assegurar a limpidez dos ensinos que abraça e garantir-lhes a difusão clara nos alicerces do discernimento e da lógica, sem o que as consciências humanas, mesmo as que estejam sob os rótulos do Espiritismo, continuarão adstritas ao fanatismo e à superstição.”

Em segundo lugar, a temática do suicídio, tão intensamente estudada por especialistas da área médica, teve seu destaque através de uma pesquisa que redundou em um livro extenso e detalhado, “O suicídio”, de 1897. Refiro-me a Émile Durkheim, nascido um ano após a primeira edição de “O Livro dos Espíritos”, foi o primeiro a afirmar que o suicídio era um fato social e deveria ser explicado por fatores sociais. O suicídio era decorrente não somente de questões individuais, étnicas, religiosas ou provenientes de desordens mentais mas também como desordem social, um estado de anomia (estado social sem regras ou normas) encontrado na sociedade. Tal estado ocorreria em situações de calamidades, em tempos de grandes transformações sociais. Para Durkheim, o suicídio é um aspecto patológico das sociedades modernas e revela de modo marcante a relação entre indivíduo e coletividade. Segundo ele, quando o indivíduo se sente só e desesperado, a ponto de se matar, é ainda a sociedade que está presente em sua consciência e o leva, mais do que sua história individual, a esse ato solitário. (Aron, 1999, p.298).

E ainda poderíamos acrescentar, como elemento motivador, épocas de crise de valores como a atual em que vivemos. Exemplo disto, é o filme “The Bridge”, criado por Michael Smith, em semanas de observação e filmagem da ponte Golden Gate, na cidade de São Francisco, Califórnia (EUA), de onde se jogam suicidas em potencial. Tentativas de suicídio, entrevistas com pessoas que surpreendentemente se salvaram com vida após projetarem-se da ponte, e as tentativas frustradas de salvar vidas por parte do criador do documentário e de sua equipe, tudo é relatado com impressionante exatidão.

E voltamos ao episódio vivido por Kardec: esses suicídios poderiam ser evitados? O que falta à sociedade que a faz refém do desespero de seus indivíduos que se projetam cotidianamente das pontes construídas pelas drogas, pelos vícios, pelos modismos, pelas carências, pelo vazio interior? Nossa sociedade está enferma. Gabriel Delanne, em tocante mensagem de 2004, alerta: vivemos um período de egoísmo feroz.

Mais do que continuar nas construções do saber, precisamos alicerçá-lo com as bases da compreensão, do respeito à vida e aos direitos do outro, à diversidade, à natureza, sob pena de vê-lo desmoronar sobre as nossas vãs e infantis criações.

Bibliografia/Fontes:
Veja a mensagem de Gabriel Delanne na íntegra: neste portal www.filosofiaespirita.org

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