Para onde caminhamos diante de tanta devastação e desrespeito à fauna e à flora do planeta?
Sonia Theodoro da Silva
A revista Our Planet, do Programa das Nações Unidas para o Meio-Ambiente, na seqüência de artigos que a caracteriza como um periódico dedicado à pesquisa e análise de assuntos pertinentes ao tema, divulga em seu número 2, duas interessantes reportagens que enfocam o tema Ecologia sob dois ângulos; o primeiro, Os valores humanos estão acima das questões financeiras, de autoria do Dr. Vandana Shiva, diretor do Fundo de Pesquisa para a Ciência, Tecnologia e Política de Recursos Naturais, de Nova Delhi, Índia. O segundo, de David Attenborough, diretor de cinema (Gandhi) e autor de documentários para a TV, produzidos pela BBC inglesa, tem por título A verdadeira Vida na Terra.
Ambos têm em comum a extrema sensibilidade crítica que leva os analistas a visualizarem a realidade das coisas, bem como o natural desencadeamento delas. O doutor Shiva diz em seu artigo, que a transmutação dos valores humanos em cifras monetárias e a ausência da compaixão nas relações humanas estão entre os fatores que causam a devastação do meio ambiente. A ligação entre ambição, escassez e destruição está no coração da crise ecológica pela qual o planeta atravessa. É conhecido de todos que as raízes deste processo estão fincadas no paradigma reducionista que trata os recursos naturais como passíveis de livre exploração, na proporção das oscilações de mercado.
Entretanto, esta não é a única via de acesso na relação homem-Natureza. Os valores espirituais tratam certos recursos e ecossistemas como sagrados – também existem os de âmbito social, como aqueles oriundos da propriedade comum. Em ambos os casos, eles não têm preço – mas um alto grau de importância para a humanidade e é precisamente devido a isto, que esses recursos não podem ser mercadejados nem estar sob o domínio da especulação financeira.
Com o advento da industrialização e do colonialismo, os recursos naturais passaram a ser requisitados como matéria prima para a produção industrial e comercialização. A Natureza trasladou-se para containeres, aguardando para serem transformadas em fonte de renda para a produção mundial. Essa fonte passou a ser simplesmente qualquer material ou condições existentes na Natureza que poderiam ser canalizados para a “exploração economica”. Entretanto, enquanto os recursos naturais podem ser transformados em cifras, estas não poderão ser convertidas naqueles.
A solução, prossegue o articulista, parece estar em atribuir mais autonomia às comunidades locais, que, dependentes da Natureza para a própria sobrevivência, sabem como explorá-la sem danificá-la. Isto também ajudaria a diminuir a pobreza.
David Attenborough, produtor de filmes sobre história natural e meio-ambiente que retratam o cotidiano de comunidades desconhecidas do glamour televisivo comum, declara-se, por sua vez, surpreso por ver o grande interesse do público nos relatos que mostram a vida real, seja numa tribo distante do coração da África, ou um grupo étnico do sudeste europeu, ou ainda o dia-a-dia de uma família do norte da Tailândia, pois não remetem a nenhuma forma de persuasão, não há nenhum jogo de interesses, ou luta por níveis de audiência.
Desta forma, a humanidade é retratada em sua legitimidade, despojada de artificialismos e do tradicional mise-en-scène social. Também mostram as inúmeras iniciativas de preservação ambiental por parte das populações locais.
Conclui o diretor-produtor, “de qualquer forma, não podemos emigrar para outro planeta, temos todos parte na proteção e conservação deste em que habitamos”. A preocupação de ambos, quanto aos abusos perpetrados contra a Ecologia, perturbando a fauna, a flora, a poluição dos rios e mares, e os próprios meios de sobrevivência humanos, é de todos nós, que assistimos como espectadores passivos, à prática sistemática de destruição, não só do planeta em si, mas dos meios naturais de sua preservação, como a camada de ozônio. Colocando-se equivocadamente como conquistador da Natureza, o homem, em instâncias primevas de relacionamento com o seu habitat, exprime a sua virulência primitiva utilizando a tecnologia como arma, e os avanços da Ciência como móvel de obtenção do lucro e da supremacia do poder.
No entanto, ele próprio, está recebendo as respostas desse abuso metódico, através das alterações climáticas violentas, da desertificação de vastas áreas do planeta, da falta de água potável, dos espaços imensos tornados estéreis pela erosão, da contaminação dos próprios alimentos que ingere, animais ou vegetais, das doenças respiratórias advindas da poluição do ar.
Em 1992, a Cúpula da Terra, no Rio de Janeiro (ECO 92) mobilizou a opinião pública com temas e revelações sobre a conservação das florestas e dos direitos das populações nativas, dentre outros temas daquele Encontro Internacional. O que mostra que houve uma preocupação geral ante as ameaças que pairam sobre as nações, embora as providências não tivessem recebido consideração posterior para se tornarem realidade. Na Rio +20, concluímos que caminhamos pouco, muito pouco mesmo diante da furiosa devastação que ora se dá no planeta. Falta conscientização, falta respeito, falta desapego aos bens de consumo.
Questionado sobre a viabilidade de uma legislação supranacional de proteção ao planeta, tema para o Direito Internacional, o Espírito Vianna de Carvalho responde: Não apenas é possível, como se torna uma necessidade urgente, porquanto o planeta estertora, aguardando soluções imediatas, a fim de serem minimizados os danos já causados, evitando-se outros que somente irão complicar a situação vigente, prejudicando todos os povos, uns antes dos outros, porém todos incursos nas mesmas consequências da insânia que grassa em governos irresponsáveis e indivíduos gananciosos.
O homem é um ser eminentemente social e depende da Natureza para sobreviver. Essa conscientização já se manifesta em grupos zeladores pela integridade do planeta e ONGs amantes do verde, nos estudiosos da Ecologia para melhor integração do homem com a sociedade e, principalmente, com a Natureza.
Na pergunta 735 em O Livro do Espíritos, a equipe do Espírito da Verdade responde a Kardec que a destruição abusiva é um sinal patente da predominância da bestialidade sobre a natureza espiritual, sendo uma violação das Leis de Deus, e, que o responsável ou responsáveis prestarão contas do abuso da liberdade que lhes foi concedida. Escravo de seus impulsos, gerados pelo atavismo do orgulho e do egoísmo amplamente exercido em épocas remotas e que teimam em permanecer vigentes em seu psiquismo de periferia, o homem atual se situa em patamares extremos, de onde parte da violência para a conivência, e assim sucessivamente. Envolvido pela própria ganância, não observa sequer que os seus próprios filhos e netos sofrer-lhe-ão as injunções atuais, quiçá ele próprio reencarnado.
É Joanna de Ângelis que arremata: Urge uma revisão de conceitos, uma mudança de conduta, um reestudo do equilíbrio para a imediata aplicação no organismo social e individual necrosado.
Todavia, é no cerne do ser – o Espírito – que se encontram as causas das ações intempestivas. Cabe a ele portanto, criar matrizes de paz para si mesmo, no pensamento e na ação constante no Bem. Na tradição hindu do Vishnu Purana, encontramos a alegoria do mundo que é destruído e recriado por um ser cósmico, quando os valores humanos falharam em manter-lhe a vida. Vishnu, o Criador, assume a forma de Rudra ou Shiva, o destruidor, e vem ao planeta para unir as criaturas novamente, sob a égide da dor. Ele surge por entre sete raios do sol abrasador e bebe todas as águas da Terra, para aplacar a sua sede, deixando todos os mares secos e os lagos tisnados, dizendo: a cobiça dos homens ocupou-os na aquisição da riqueza perecível e do poder transitório; fixaram seus desejos sobre os bens, mesmo que desonestamente adquiridos; nenhum homem repartiu o que era seu, para ajudar o necessitado, por isso sofrerá ao que fez o outro sofrer e lutará por resgatar o que perdeu. É a alegoria da Lei de Causa e Efeito, universalmente intuída, e que exprime, de forma singela e natural, que a cada um será dado conforme as suas obras.