A liberdade tem sido amplamente discutida, comentada, parafraseada, alardeada e, possivelmente, banalizada nos últimos dias, especialmente, após a tragédia ocorrida com os 12 jornalistas em Paris.
Movimentos se espalharam rapidamente ao redor do mundo ao sabor das notícias marteladas pelos meios de comunicação, que não pouparam esforços para defender o valor da liberdade de expressão.
Claro que as manifestações são necessárias e contribuem para o exercício da cidadania, especialmente se pacíficas, porém, pergunto-me, será a liberdade de expressão o valor mais importante para o Ocidente?
A liberdade entendida de forma ampla abarca além da liberdade de expressão, outras liberdades, dentre elas a liberdade de credo, de ir e vir, liberdades políticas, e etc.
As liberdades, por suas vezes, não se sustentam sem outro direito fundamental, qual seja, a igualdade, ambos os direitos traduzem, de fato, o conjunto de valores fundamentais, que moldaram o homem ocidental contemporâneo.
A liberdade se espraia até a divisa da liberdade do outro. O respeito destes limites é que nos confere o caráter social e a civilidade.
Entender estes limites e respeitá-los permite que a igualdade, também, possa ser construída e possa se espraiar.
Os protagonistas da tragédia de Paris, e tantos outros protagonistas anônimos de tantas outras tragédias em qualquer local do Globo, simplesmente nos mostram que os pilares ruíram ou talvez não estejam, de fato, erguidos, como bradam os Países representantes dos ideais ocidentais.
A Guerra Civil na Síria, Nigéria, Ucrânia, sem contar todos os outros conflitos iniciados há décadas, no Continente Africano, que já caíram no esquecimento da grande mídia, mas que ceifaram, e ainda, ceifam vidas de civis, mulheres e crianças.
O maior conflito não é aquele que está nos tablóides atuais, mas todos eles sem exceção.
Todos os conflitos deveriam ser discutidos, divulgados, explicados, sendo objeto de passeatas e manifestações, para que com tais atos, conseguíssemos evitá-los.
Vivemos ainda uma sociedade em construção, pois os direitos fundamentais ainda não estão fincados solidamente, pois são sistematicamente, lesados seja pelas autoridades públicas como pelos próprios cidadãos.
Porém, o que urge de maneira gritante neste momento é a ofensa, sistematizada, do direito à Vida.
Este sim o direito por excelência, o direito de primeira grandeza, posto que se traduz como o primeiro direito, o que está no topo da pirâmide, o direito natural do homem, o direito sagrado, sobretudo.
Sem Vida, e vida em sociedade, não há direitos decorrentes a serem postulados e, consequentemente, garantidos.
Os terroristas, tidos como ofensores, ofenderam, sim, a vida daqueles jornalistas.
E não precisaria de mais nenhuma ofensa, para justificar o legítimo repúdio que todos sentiram com tais atos.
A ação terrorista entabulada não se justifica sob nenhum aspecto, porém, podemos pensar que talvez o motivo que os levou a tal barbárie decorra da lesão que, de uma forma reflexa e deturpada, sofrem em seus direitos de credo.
Defendiam os agressores, evidente que de forma, desarrazoada e bárbara, o seu direito de credo, que por sua vez, deve e merece ser garantido e defendido.
Defendiam os vitimados, ao se expressarem de forma ampla e irrestrita, também, de forma desarrazoada o seu direito à livre expressão.
Nota-se que pelos excessos de todos os lados, instalou-se a ausência absoluta da igualdade, pois ambas as partes ultrapassaram, e muito, os seus limites, invadindo os limites do outro, acabando por massacrarem-se a si próprios, esvaziando totalmente os direitos que postulam com tanta veemência.
Perderam a razão.
E pelo desrespeito a igualdade de todos os homens, a vida pereceu e está perecendo em todos os cantos da terra, justamente pelo afã do homem em se impor e impor a sua razão, a sua forma de vida.
As vidas foram ceifadas e a resposta da sociedade deveria ser em prol de garantir o direito à vida, sobretudo.
Somente a vida nos confere uma sagrada possibilidade de redenção.
O mote das manifestações passa ao largo desta questão, que nos parece, fundamental.
Elevaram-se apenas brados libertários, como se somente o conjunto de valores ocidentais devesse prevalecer no globo, esquecendo-se que somos todos iguais, merecedores de estarmos vivos em todas as faces do orbe terrestre.
As manifestações jogaram luz a uma pequena parte do problema, esquecendo-se de evidenciar o vilipêndio brutal da vida em vários pontos do globo, por outras razões, tão ou mais nobres do que o direito a liberdade de expressão, e mesmo assim, a sociedade ocidental, deu-se as mãos de forma elitista, de forma exclusivista, cindindo a humanidade em bons e maus, segregando ao invés de congregar, fomentando mais ódio a homens que não sabem o que fazem.
Neste contexto, percebemos a necessidade de se trazer à tona o debate acerca da necessidade de se fomentar valores humanos e não somente direitos humanos.
Os direitos humanos somente serão garantidos quando de fato se exercitar de forma plena os valores humanos.
E tais valores dizem respeito às virtudes humanas, como a bondade, amor, paz, honestidade, humildade, sabedoria, segurança, alegria, coragem, conduta correta, conduta pacífica, e poderíamos nos estender por mais diversas virtudes, sem esgotar o rol de valores que devem cercar o verdadeiro modelo do Homem de bem.
Podemos introjetar estes valores em nossa formação humana, a partir do amplo exercício do autoconhecimento, que é o caminho para se atingir a plenitude existencial e espiritual.
Este é o caminho para conseguirmos cultuar verdadeiros valores.
Os Espíritos Superiores já nos ensinaram o que fazer e o que cultivar para nos tornarmos homens de bem, mas somos alunos dispersos e negligentes.
Praticar a lei de justiça, amor e caridade em sua maior pureza – artigo 918 do Livro dos Espíritos e Capítulo XVII, item 3 do Evangelho Segundo o Espiritismo.
Assim, não bastam apenas levantes por direitos, sem cultuarmos os valores humanos, que deverão ser fomentados no nosso dia-a-dia, em cada palavra, em cada gesto, em cada possibilidade de contato com o próximo.
Este foi e será o maior exemplo dado pelo Mestre Jesus: respeitar o outro, em suma: amar ao próximo, como a nós mesmos e a Deus sobre todas as coisas.
Cristiane R. Garcia